quarta-feira, 26 de maio de 2010

O SUS


Um sistema efetivamente de Saúde, e não de tratamento de doenças, pautado na lógica da prevenção de doenças e promoção da saúde e nas ações intersetoriais, fundamentais na construção do seu arcabouço estruturante. Um sistema financiado de forma tripartite, de acordo com as suas reais necessidades e levando em consideração a capacidade de cada ente federado. Um sistema eminentemente público, que não exclui a possibilidade de exploração da saúde pelo setor privado e que considera a possibilidade de sua participação complementar.

Um sistema universal, integral e democrático, com a experiência única de participação de todos os atores sociais na definição das suas estratégias e no acompanhamento das suas políticas e da sua fiscalização, inclusive nos aspectos financeiros. Por fim, um sistema com responsabilidades na formação e na qualificação da sua força de trabalho, num permanente processo de aperfeiçoamento e valorização e na indispensável e insubstituível ação multiprofissional de forma integrada.

Um sistema quase perfeito num país autoritário, concentrador de renda e excludente, que só se viabilizou legalmente graças a um momento privilegiado da nossa história, com uma conjunção única de fatores, a militância pela Reforma Sanitária em plena efervescência e a redemocratização.

Exatamente em função do seu conteúdo transformador, em apenas 21 anos o Sistema Único de Saúde promoveu uma verdadeira revolução no Brasil. Moléstias foram praticamente erradicadas, o perfil sócio epidemiológico evoluiu significativamente, a expectativa de vida se ampliou rapidamente, melhorou substancialmente a qualidade de vida do nosso povo e temos um sistema gigantesco, que está entre os maiores do mundo e disponibilizado à população sem nenhum custo adicional. No entanto, esse mesmo sistema apresenta profundas distorções e está, em função disso, em vias de ser inviabilizado.

Apesar de experiências importantes, porém pontuais, na perspectiva da prevenção, continuamos presos a uma lógica dos leitos hospitalares, dos medicamentos de alto custo, dos exames laboratoriais especializados e do profissional médico. Os profundos limites orçamentários dos municípios brasileiros, o descumprimento solene e sistemático da Emenda Constitucional 29 pela imensa maioria dos estados e a sua não regulamentação pelo Congresso Nacional, somados a ocupação da gestão por grupos organizados, que administram os serviços de acordo com os interesses dos poderosos de plantão, tornam o SUS um sistema com um subfinanciamento crônico. Apesar da definição teórica de sistema público, fomos atacados pela ação patrimonialista dos grupos políticos e econômicos, que promoveram um verdadeiro assalto ao SUS, iniciado com a massiva contratação de serviços em substituição aos públicos, avançaram na gestão do trabalho por meio dos processos de terceirização de mão de obra, e que nesse momento dão o golpe final e mortal com a privatização da gerência dos serviços públicos através das organizações sociais, OSCIPs, Fundações e congêneres. Tudo à revelia da Lei. As diversas experiências realizadas no mundo comprovam inexoravelmente que é impossível se financiar plenamente um sistema de saúde que se propõe universal e integral, na lógica de mercado.

Conselhos de Saúde com profundas limitações na sua organização e tendo o sistemático desrespeito às suas deliberações como regra, e uma força de trabalho precarizada na forma de contratação e remuneração, com brutais diferenças de tratamento salarial e sem perspectivas de evolução profissional, completam o quadro de agonia desesperadora que o SUS enfrenta.

Temos na prática, portanto, uma fantástica e includente proposta social que pode ser inviabilizada muito rapidamente, em função das enormes diferenças entre o seu arcabouço jurídico teórico e a sua execução e pela impunidade que infelizmente tem sido a regra em todos os quadrantes do país e em todas as esferas de governo. Apresentamos ao país, através da Caravana Nacional em Defesa do SUS, ao Conselho Nacional de Secretários de Saúde, Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde e ao Ministério da Saúde, e estaremos apresentando brevemente ao Congresso Nacional e ao Presidente da República, a nossa agenda política com vistas à superação de todos esses problemas, a seguir:

- Prover os serviços de autonomia administrativa e financeira estabelecendo o Contrato de Gestão e o permanente processo de avaliação com instrumento de relação entre os entes públicos;

- Profissionalizar a administração pública até o cargo de diretor, como forma de extinguir a exploração política do sistema e combater a ineficiência;

- Criar a carreira única do SUS com responsabilidade tripartite na contratação e na remuneração, de forma pactuada, e contemplando o estímulo à qualificação, interiorização e dedicação exclusiva;

- Serviço Civil em Saúde de pelo menos dois anos em toda a rede do SUS, para todos os profissionais graduados na área de saúde;

- Alterar a Lei de Responsabilidade Fiscal no que diz respeito às reais necessidades de contratação de profissionais para a rede pública, combatendo assim a terceirização e a precarização da força de trabalho;

- Aprovar no Congresso Nacional, a Lei de Responsabilidade Sanitária;

- Regulamentar a Emenda Constitucional 29, contemplando a criação da Contribuição Social para a saúde;

- Elaborar um projeto nacional de fortalecimento da rede pública estatal, bem como contribuir com os municípios com a finalidade de estruturação da rede de atenção primária em todos eles.

Por Francisco Batista Júnior - Presidente Conselho Nacional de Saúde

Nenhum comentário:

Postar um comentário