segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Com a palavra: a mãe de Dilma


O telefone tocou por volta de 21h30. “Mãe, eu estou muito feliz. Como a senhora está?”, perguntava Dilma, a filha. “Eu estou muito bem, felicíssima˜, respondeu Dilma, a mãe. A rápida conversa no domingo à noite foi logo interrompida do outro lado, em Brasília, por alguém que chamava a recém-eleita para algum compromisso. “Mãe, te ligo mais tarde”, despediu-se a filha de dona Dilma Jane Silva Rousseff, pouco antes de fazer o primeiro pronunciamento à nação como presidente da República.

Do lado de cá da linha, dona Dilma, 86, também não parava de atender aos telefonemas de familiares cumprimentando pela vitória de sua filha nas urnas.

“Eu já estou acostumada. De repente, quando nós duas estamos almoçando, o telefone toca e ela nem termina de comer”, conta a mãe, em sua casa no bairro São Luís, região da Pampulha. Era lá que a nova presidente do Brasil costumava se reunir com seus aliados políticos mineiros quando vinha a Belo Horizonte, entre eles o ex-prefeito da capital Fernando Pimentel, candidato derrotado na disputa pelo senado.

Muito bonita, produzida e, acima de tudo, feliz, dona Dilma não se cansava de dizer a O TEMPO como estava satisfeita com vitória da filha, “depois de tudo que ela passou”. “O que fizeram com minha filha nessas eleições, eles acabaram com ela. Foi uma campanha muito dura”, desabafou.

Na entrevista, a mãe da primeira presidente mulher do Brasil falou de tudo: a infância da filha, a prisão pela ditadura e de política. Relembrou a paixão da nova presidente pela leitura. "Ela sempre gostou muito de ler. Como o ensino naquela época era muito diferente de hoje, ela foi aprender mesmo a ler com 7 anos”, contou. Dilma estudou no Instituto Izabela Hendrix.

“Dilminha sempre foi muito rápida. Ela tem o raciocínio muito rápido, puxou o pai (o engenheiro e poeta búlgaro Pétar Russév, naturalizado brasileiro como Pedro Rousseff, morto na década de 70). Não que eu seja burra”, brincou a professora aposentada, cercada pelos cinco cachorrinhos que vivem com ela e a irmã, Arilda Terezinha Silva. Até para cozinhar, a presidente eleita é ágil, garante a mãe. “Acho que é porque ela não tem muito tempo, então ela tempera tudo muito rápido”.

Questionada sobre o prato favorito da filha ilustre, dona Dilma diz que ela come de tudo, "desde que seja bem temperadinho”. E se lembrou de quando ela estudava no bairro Sion, no colegial, e tinha uma colega que adorava almoçar em sua casa porque sempre tinha sardinha. “Ela sempre gostou muito de peixe. Tinha que fazer sardinha lá em casa pelo menos duas vezes por semana”, contou.

Por ironia do destino, a mãe de Dilma não pôde dar a ela seu voto no segundo turno. Ela havia se cadastrado para votar em trânsito, e, como havia desistido de viajar, não conseguiu votar na sua seção, em Belo Horizonte.

CONFIRA TRECHOS DA ENTREVISTA COM A MÃE DA PRESIDENTE ELEITA:

A senhora está preparada para ser a mãe da presidente do Brasil? Quantas entrevistas a senhora já deu hoje?

Esta é a quarta. Estou preparada, sim. Estou achando muito gostosa essa situação, até porque acho que não deve durar muito (o assédio da imprensa). Acho que não deve chegar a um mês.

Olha, dona Dilma, acredito que será por um tempo bem maior...

Não tem problema, devo viajar também, ficar algum tempo fora...

A senhora imaginava, quando Dilma era pequena, que teria uma filha tão importante um dia?

Não, não imaginava. Até para você ver, o Serra planejou tantos anos para ser presidente do Brasil e não conseguiu, e de repente a minha filha é que é eleita. Foi tudo muito rápido. É uma emoção muito grande.

Como a sua filha está agora, depois de uma maratona tão intensa de compromisso, viagens, denúncias?

Ela está muito bem. Cansada, apenas, mas a vitória revigora as forças. E digo com certeza que ela está preparada para governar o Brasil e tem total condições de fazer um bom governo, ao contrário do que muitos dizem.

No final do primeiro turno, a candidata parecia mais inchada, e surgiram rumores de que ela teria retomado o tratamento contra o câncer...

Não, de jeito nenhum. Gorda, ela estava muito gorda mesmo, mas é por causa daquele remédio que ela teve que tomar para a garganta, corticóide. No final, ela já estava quase sem voz. Dilminha fez recentemente exames de controle e está tudo bem.

O que a senhora achou da campanha? Foram muitas denúncias envolvendo aliados da sua filha...

Eles acabaram com ela, a turma do PSDB. Foi tudo muito duro. Todos nós sofremos muito. Chegaram até a falar que ela não era brasileira. Imagine só. Era só procurar nos arquivos das escolas onde ela estudou aqui em Belo Horizonte. Só porque o pai dela era búlgaro. Não é demais? E olha bem, para você ver, nós não podemos imaginar o que as pessoas que a gente tanto confia são capazes de fazer, como essa Erenice, que colocou os filhos lá.

Ela chegou a desabafar com a senhora sobre as denúncias envolvendo a sucessora dela na Casa Civil, Erenice Silva?

Dilma não me conta nada, ela costuma dizer que eu sou muito faladeira. Aliás, ela nunca foi de desabafar, ela acha que eu sou mais frágil que ela. Nem quando ficou presa e foi torturada ela me contou como foi.

Como foi quando a senhora descobriu que sua filha tinha sido presa?

Ela tinha fugido daqui na época do golpe militar. Eu fiquei um tempo sem procurar por ela. Não podia procurar, para não despertar a atenção. E aí veio a notícia de que ela tinha sido presa. Só pude visitar um mês depois.

E como foi a visita?

Muito rápida, muito vigiada. Depois que eu vi minha filha magrinha daquele jeito, chorei por duas horas sem parar. Eles queriam até me levar para a enfermaria, mas eu disse que enfermeiro nenhum poderia curar a dor de uma mãe ver a filha presa e torturada.

A senhora sabia que ela fazia parte de movimentos de esquerda?

Sabia, mas só fui cair em mim quando houve o golpe militar. E eu dizia para ela e as colegas: “vocês deviam estudar em vez de ficar fazendo revolução”. Mas não posso reclamar, ela sempre estudou muito.

Como é a Dilma como mãe e como filha?

Nossa, eu acho que ela mima demais a filha dela. Nunca vi dar tanta atenção. Chega até a ser um luxo. Eu já sou mais livre, deixou meus filhos voarem... Ela é uma filha muito preocupada, sempre presente.

Desde que ela entrou para o governo, a senhora se encontra sempre com sua filha?

Nestes oito anos em que ela esteve no governo do Lula, nos encontrávamos mais no início. Ela vinha aqui, nós íamos lá em Brasília. Mas os compromissos iam só aumentando. Mas sempre ela aparece por aqui.

A senhora já conhece o bisnetinho?

Já, fui lá no Rio Grande do Sul quando ele nasceu. Vai fazer dois meses daqui a sete ou oito dias.
 

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